No curso da Oficina da Palavra, aprendi muito sobre escrita, tanto com meus colegas, quanto com Cyntia, que era, afinal de contas, uma parceira também. Dentre as coisas aprendidas (são tantas e não poderiam de algum modo caber num breve depoimento), três delas considerei mais importante, por tê-las como qualidades importantes para a formação de um escritor, seja do que for. Vou listá-las aqui.
Primeira coisa: aprendi que não se deve ter medo de escrever. Como você já deve ter suspeitado, isso não lhe garante um bom texto, mas, sem dúvidas, tentar é o único começo possível.
Não é raro decepcionar-se com seu próprio texto; no entanto essas decepções, que certamente qualquer escritor encontrará, devem ser tomadas de forma otimista e não como um indício de inaptidão (um escritor é teimoso feito mula).
Segunda coisa: aprendi que escrever é, afinal de contas, um trabalho artesanal, exigindo uma certa medida de dedicação. Pode ser comparado facilmente à mais antiga arte: a de preparar uma refeição. Você escolhe a palavra como quem escolhe o ingrediente; você a apalpa, sente seu relevo, sua moleza, sua dureza; você a leva perto do nariz para sentir seu cheiro.
A organização da cozinha faz muita diferença no resultado; então, seja a sua bagunçada ou asseada, tenha certeza de que o lugar onde você cozinha afetará definitivamente a refeição. E, no final, quando tudo estiver servido em pratos, e seus convidados, muitos ou poucos, começarem a comer e a elogiar o guisado, lembre-se de que, afinal de contas, isto é tudo artesanato, fruto de mais erros do que de acertos.
A terceira coisa que aprendi, gostaria de dizê-la a curto e grosso modo.
Não se aborreça com a perfeição.
Você não é perfeito, o mundo não é perfeito e, se tudo correr bem, seu texto não será perfeito, também (e agradeça sua a escrita sincera por isso).
“Como assim?”, você certamente vai me perguntar.
O belo nem sempre (ou, talvez, só raramente) é perfeito. O belo também é assimétrico e real, tem ranhuras e é áspero, como um móvel rústico. Buscar a perfeição é comer para sempre esperando uma saciedade que nunca chega. Mexa as palavras, torne-se um artesão, mas não deixe a ideia fugidia da perfeição lhe paralisar.
Agradeço ao curso e a seus colaboradores pelo aprendizado.
Abraços do Luiz 😀
Luiz Carlos Espíndola – 2015-2
estudante de psicologia
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[Poderia informar CPF?]
-Alô! Mariano Conceição se encontra?
-Oi? Quem fala?
-Oi, sou Jesus Cristo, consultor de vendas do banco Itaú. Tudo certo com o senhor?
-Tudo certo, sim. Tudo legal. Olha, se o senhor quiser me vender algo, eu não tô podendo, não.
-Certo, senhor. Mas poderia ao menos ouvir a proposta? Pode interessar.
(silêncio na linha)
-Tá legal, mas fala rapidinho que eu não tenho muito tempo.
-Muito obrigado. Eu-venho-oferecer-em-nome-do-
-É cartão de crédito?
-SIm, senhor.
-Não tenho interesse. não, obri-…
-Poderia me informar CPF, para checar cadastro?
-Desculpe?
-Poderia me informar CPF?
-Lógico que não!
-Por quê, senhor?
-Porque eu não quero cartão.
-O senhor ainda não ouviu a proposta inteira.
-Não ouvi, mas eu não quero cartão de crédito, tenho dois já.
-O senhor viaja?
-Como é que é?
-Eu perguntei se o senhor viaja, porque nosso cartão oferece as melhores vantagens para o cliente que viaja: milhas aéreas, consierge, entre outros.
-Me desculpa, mas não quero mesmo… Vem cá, só uma coisa. O que é consierge?
-Ah, você chega numa cidade diferente e pode ligar pra o serviço pra reservar restaurante, essas coisas.
-Ah certo, muito obrigado, não vou querer.
-O senhor vai ao cinema?
-Não muito.
-Gosta de passear de stand up paddle?
(silêncio na linha)
-Olha, amigo, qual seu nome, mesmo?
-Jesus, Jesus Cristo.
-Olha, Jesus, eu estou tentando recusar o produto numa boa, sem desligar na sua cara, mas você não se ajuda.
-Seria uma pena se o senhor desligasse o telefone na cara de Jesus Cristo, você falharia no teste.
-Teste? Do que você está falando?
-Lembra daquela história que sua mãe contava? Aquela história velha;
-Não lembro.
-A família recebe a mensagem de que Jesus vai vir visitar a casa, preparam um banquete, coisa grande, daí bate na porta um homem todo sujo e esfarrapado pedindo comida, eles negam o rango, porque, sei lá, são elitistas, e depois descobrem que bateram a porta na cara do filho de Deus.
-Hmmm. Tu tá de brincadeira comigo, né?
-Não, não mesmo, senhor. Faz um ano que paramos com esse negócio de porta-em-porta, porque dava muito trabalho. Com a telefonia, hoje em dia, ficou bem mais fácil. A gente tá fazendo isso por telefone.
-A gente?
-SIm, eu e meus dois sócios: o espírito santo e Deus-pai-todo-poderoso, mas esse é só o nome jurídico da firma dele, a gente chama ele de Iavé.
-Entendo.Mas, peraí, na estória que minha mãe contava, a gente recebia uma carta prevenindo a visita.
-Não é mais carta, Mariano. Agora a gente manda e-mail.
–E-mail?
-É.
-Mas eu abri o meu hoje e nada.
-Checou a caixa de spam?
-Puta merda.
-O senhor podia me informar CPF?
(silêncio na linha)
-Peraí, deixa eu pegar na carteira.
Luiz Carlos Espíndola – 2015-2